A crise gerada pela covid-19, doença causada pelo novo coronavírus, tem um forte impacto na vida de jovens com problemas de saúde mental pré-existentes. A perda da rotina, o fechamento das escolas e o cancelamento das provas são alguns dos fatores envolvidos.
Para adolescentes, perder a liberdade é algo muito difícil. Lígia e sua família, por exemplo, estão em isolamento em seu apartamento no Reino Unido desde o dia 18 de março, porque sua mãe está nos últimos meses da gravidez.
Para alguém que estava sempre fora de casa, encontrando amigos e trabalhando, ela diz que é um desafio ficar presa em um apartamento com quatro pessoas.
“Desde o início do isolamento, minha ansiedade aumentou muito”, diz Ligia. “Com frequência, ela vem sem que eu espere. Tenho dificuldade em respirar e pensar direito. É uma sensação de confusão.”
O maior “golpe”, ela conta, foi o cancelamento das provas do final do ensino médio pelo governo do Reino Unido, para as quais ela estava se preparando (no país o ano letivo começa em agosto e termina em junho do ano seguinte).
“Foi muito difícil. Eu chorei”, diz ela. “É como se eu estivesse me preparando para correr uma maratona e, pouco antes do início, já na linha de partida, me dissessem que eu não iria correr.”
A jovem continua. “Eu passei muito tempo me preparando para a prova. E agora não posso nem sair para me distrair.”
Mas Ligia encontrou estratégias para melhorar sua saúde mental. “Eu arrumo a cama de manhã para não voltar a me deitar. Tento regular minha respiração e ouvir músicas relaxantes”, diz.
Naomi, de 21 anos, diz que sua ansiedade também aumentou muito por causa do coronavírus. Estudante de psicologia, ela teve as provas de final de semestre canceladas e, embora as aulas tenham sido feitas às distância, pela internet, a falta de rotina e incertezas quanto ao curso a afetaram.
Coisas que ela fazia para controlar a ansiedade, como voluntariado e seguir uma rotina rígida que a fazia sair de casa, não são mais uma opção. Então ela teve que desenvolver novas ferramentas.
Naomi tem escrito um diário, onde tenta responder questões como “O que está me fazendo me sentir assim?” e “Pelo que estou grata hoje?”.
“Essas perguntas me ajudam a pontuar o que eu fiz durante o dia, o que foi positivo, e também o que me preocupa”, diz ela.
Outro ponto positivo é o forte senso de comunidade que a crise do coronavírus criou. “Estamos todos juntos nisso e é bom saber que outras pessoas por aí entendem essa preocupação.”
Ao mesmo tempo, ela tem medo de que pessoas como ela, que tem problemas de saúde mental crônicos, sejam esquecidas.
Uma pesquisa do instituto YoungMinds, organização não-governamental pela saúde mental dos jovens, mostrou que a pandemia está tendo um efeito profundo em jovens com questões ligadas a saúde mental. Embora eles entendam a necessidade das medidas de isolamento social, diz a pesquisa, isso não diminuiu o impacto em sua saúde.
Muitos dos que participaram da pesquisa relataram aumento da ansiedade, problemas para dormir, ataques de pânico ou maior desejo de se automutilar.
Profissionais que trabalham no setor de saúde mental juvenil continuam a oferecer apoio, afirma a entidade. “Eles estão fazendo tudo o que podem para chegar aos jovens, apesar do contato presencial não ser possível”, diz Emma Thomas, diretora da YoungMinds.
Outra organização que notou mudanças resultantes da crise do coronavírus é a Shout, um serviço de mensagens de celular 24h para pessoas em crise. Na última semana, eles tiveram um aumento constante no número de pessoas procurando o serviço, chegando a mais de mil conversas em um dia.
Cerca de 70% das pessoas que os procuram tem menos de 25 anos. Neste grupo, a entidade percebeu um aumento no número de conversas sobre o coronavírus — elas agora representam 25% dos assuntos do dia.
Entre os atendimentos sobre o coronavírus, 60% envolvem questões ligadas a ansiedade — trata-se do dobro do normal.
“É só ansiedade, ansiedade, ansiedade“, diz Amy, uma das voluntárias do Shout. “O tema geral tem sido a falta de controle.”
Amy diz que as pessoas em crise têm dificuldade até de falar ao telefone, então mandar mensagens pode ser mais fácil. Em suas conversas, ela procura acalmar e ajudar a pessoa a decidir sobre os próximos passos.
Muitos estão sofrendo com a perda da rotina, então uma das missões de Amy é ajudar a criar uma nova.
“Sem uma rotina, eu sei que muitos hábitos ruins e pensamentos ruins podem aparecer”, diz Amy, que já teve ela mesma problemas de saúde mental.
Estratégias para lidar com os problemas
Desde o início do isolamento, John, de 18 anos, tem tido dificuldade para lidar com sua depressão. Sua família está em quarentena desde 15 de março, quando sua mãe teve suspeita de covid-19.
Ser forçado a ficar em casa teve impacto negativo na saúde mental do jovem.
“Normalmente, se eu estivesse muito mal, eu fazia um passeio de ônibus só para conseguir clarear meus pensamentos um pouco”, diz ele. “Eu escolhia uma linha de ônibus e percorria ela toda. Agora não posso fazer isso. Estou preso em meus ciclos de pensamento e tenho me sentido mais cabisbaixo que o normal.”
John já perdeu um semestre e meio na escola por causa de um episódio de depressão e já tinha se convencido de que iria repetir de ano.
O fechamento da sua escola na verdade o ajudou, porque os recursos agora estão disponíveis online e ele prefere essa forma de aprender.
No entanto, John ainda não conseguiu se encontrar com o novo psicólogo por causa do isolamento, e isso o preocupa.
“Eu não quero me sentir pior”, diz ele. Embora seja “bastante noturno”, ele tenta sair do quarto o máximo que pode para que possa dormir melhor.
“Se você está constantemente fazendo atividades no seu quarto, quando você quer dormir vai ficar preso nesses pensamentos. Então eu tento ir para a sala ou para o jardim quando posso. Sinto que isso me ajuda.”
Chloe, de 13 anos, ficou acordada até a meia noite nesta semana arrumando seu quarto só para se manter ativa.
“Quando ela começa algo, ela fica bastante obsessiva com isso”, diz a mãe, Julie Cambridge.
Filha caçula, Chloe tem déficit de atenção e ansiedade, e desde que as escolas fecharam ela tem “subido pelas paredes”, diz Julie. A adolescente normalmente é muito ativa, pratica esportes e está sempre com os amigos.
“Agora eu estou entediada e com preguiça”, diz Chloe. “Eu quero sair porque fico com claustrofobia.”
Ela ouve música, fala com os amigos nas redes sociais e tem feito aulas à distância. Mas sua ansiedade piorou, e ela tem estado de mau humor.
A filha de 16 anos de Julie, Jade, perdeu a motivação para estudar quando as provas de fim de ensino médio (cujas notas são necessárias para entrar na faculdade) foram canceladas.
Jade quer estudar biomedicina na universidade. Diz que suas notas são boas, mas quer melhorá-las ainda mais.
“Eu estou preocupada com a ‘geração covid’, os que não conseguiram fazer as provas. As pessoas vão tratá-los de forma diferente porque eles não fizeram os exames?”, diz Julie. “É um senso de realização que eles estão perdendo.”
Provas e formaturas são rituais importantes para o desenvolvimento dos jovens, diz o psicólogo Hanspeter Dorner, especialista em crianças e adolescentes. “Perder esses rituais pode ter um impacto negativo, ainda que seja possível passar por eles no futuro”, diz ele.
Naomi e seus colegas de faculdade estão querendo fazer justamente isso.
Os jovens estão planejando fazer uma festa de formatura em algum momento no futuro. “Podemos tentar marcar para a mesma época em que nos formarmos para finalmente termos uma comemoração”, diz ela.
“A festa é uma forma de encerrar uma fase da vida e é importante que a gente tenha a oportunidade de fazer isso.”
Fonte: BBC
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